A lenda do soldado morto – Bertolt Brecht
Bertolt Brecht (1898-1956)
Dramaturgo e poeta alemão
Durava mais de seis anos a guerra
E a paz
não apareceu
Então o
soldado se decidiu
E como
herói morreu
Mas como
a guerra não terminou
O rei vendo
morto o soldado
Ficou
muito triste e pensou assim:
Morreu
antes do fim.
O sol
esquentava o cemitério
Onde o
soldado jazia em paz
Até que
uma noite chegou ao front
Um médico
militar
Tiraram
então o soldado da cova
Ou o que
dele sobrou
E o
médico disse
“Tá bom
pro serviço
ainda tem
muito pra dar!”
Saíram
levando o soldado
Que já
apodrecia
Rezavam
em seus braços duas freiras
E uma
puta vadia
E como o
soldado cheirava a morte
Um padre
em frente ao andor
Perfumando
a cidade com nuvens de incenso
Para
encobrir o fedor
A banda
ia na frente da procissão
Fazendo
bum, bum, trá, trá
E para
que o soldado marchasse
Como num
batalhão
Dois
enfermeiros erguiam o soldado
Para
mantê-lo de pé
Pois se
ele caísse no chão
Virava um
monte de lixo!
Na frente
marchava um homem de fraque
Usando
gravata engomada
Um bom
cidadão consciente de ser
“Patriota da Pátria Amada”
Tambores
e gritos de salvação
A mulher,
o padre e o cão
O soldado
ia morto cambaleando
qual um
mico de porre dançando
E quando
passavam pelas cidades
Ninguém
enxergava o soldado
E todos
entravam na grande marcha
Gritando:
“Pela Pátria lutar!”
Agitavam
bandeiras esfarrapadas
Para
esconder o soldado
Que só
podia ser visto de cima
Mas em cima
só brilham estrelas…
Mas as
estrelas não estão sempre lá
E outro
dia nasceu
Então de
novo morreu o soldado
E foi
outra vez enterrado!
*****
Calendário Histórico
1933: Brecht foge da Alemanha –
Por Dirk Kaufmann (ns)
Bertolt
Brecht fugiu da Alemanha nazista em 28 de fevereiro de 1933, um dia após o
incêndio do Reichstag. O escritor sabia que logo começaria a caça à esquerda e
aos opositores do regime de Hitler.
Bertolt Brecht
No dia em que o escritor Bertolt Brecht deixou a Alemanha, em 28 de fevereiro
de 1933, a notícia nem sequer saiu no jornal. Ele não anunciara que iria deixar
o país, e o tema das manchetes do dia era outro: o incêndio do Reichstag, na
véspera.
A polícia responsabilizou a esquerda e logo apresentou o suposto autor do incêndio.
Os nazistas aproveitaram para prender um grande número de sindicalistas,
socialistas e comunistas, que foram enviados aos primeiros campos de
concentração, improvisados para esse fim.
O visionário que conhecia o perigo
Como nenhum outro intelectual, Brecht previra a catástrofe iminente, o que
aconteceria se os nazistas assumissem o poder na Alemanha. Sua Lied vom
SA-Mann (Canção do homem da SA) deixa transparecer toda a sua
clarividência.
Nela, ele descreve como a depressão no final da década de 1920, as batalhas de
rua e as eternas crises de governo culminariam nas barbáries do Terceiro Reich.
"Dormi de fome, com o estômago roncando. Pegando no sono ouvi gritarem:
'Acorda Alemanha'. E vi muitos marcharem gritando 'Vamos ao Terceiro Reich!' Eu
não tinha nada a perder e fui com eles, sem me importar para onde."
Em 1933, aconteceu o que se temia e Adolf Hitler tornou-se chanceler do Reich.
No mais tardar, após a tenebrosa marcha com tochas pelo Portão de Brandemburgo,
em Berlim, em honra ao novo detentor do poder, ficou claro que a sombria
intuição de Brecht logo se transformaria em realidade.
O êxodo dos intelectuais
Não demorou muito e começou o êxodo dos intelectuais alemães. Nem todos, porém,
quiseram ou puderam fugir a tempo, como o detentor do Prêmio Nobel da Paz Carl
von Ossietzky, que foi levado a um campo de concentração e morreu em
consequência das torturas.
Outros, como o escritor Erich Kästner, se retiraram da vida pública e assim
sobreviveram ao "reino de mil anos" que Hitler pretendia instituir. A
história, contudo, se lembra mais dos que quiseram conseguiram escapar: Albert
Einstein, os escritores Lion Feuchtwanger, Thomas Mann, Erich Maria Remarque,
os músicos Kleiber, Busch, Klemperer e muitos outros.
Brecht foi um dos primeiros a deixar o país, por saber o que o aguardava quando
o partido de Hitler começasse a colocar em prática suas ameaças. Num poema em
prosa, ele expôs as razões de sua perseguição: "Quando me forçaram ao
exílio, os jornais publicaram que foi por uma poesia minha, ridicularizando o
soldado da Primeira Guerra Mundial. Agora, quando eles preparam uma nova guerra
mundial, decididos a superar as monstruosidades da última, é quando se persegue
ou se mata gente como eu, por delatar os seus atentados".
A lenda do soldado morto
A poesia a que Brecht se refere, que teria inspirado o ódio dos nazistas, é Legende
vom toten Soldaten (Lenda do soldado morto), um poema pacifista que se
refere à Primeira Guerra Mundial.
Como faltassem soldados ao exército do Império Alemão, decidiu-se desenterrar
um soldado que morrera, vesti-lo com um novo uniforme e arranjá-lo para que
passasse pelo exame médico e fosse mandado de volta ao front. Sob os aplausos
do clero e dos representantes do grande capital, o defunto foi enviado ao campo
de batalha para morrer como herói.
Os nazistas não odiavam apenas o poeta Bertolt Brecht, odiavam também o seu
pacifismo e o fato de ele ser comunista. Na sua Balada da árvore e dos
galhos, de 1931, Brecht antecipou o comportamento assassino das hordas nazistas,
no dia em que pudessem agir livremente.
Fuga para a Dinamarca
Com sua visão, Brecht decidiu fugir assim que soube do incêndio do prédio do
Reichstag. Um dia depois, na manhã de 28 de fevereiro de 1933, deixava Berlim
em direção a Praga. Da capital da então Tchecoslováquia foi a Viena, de lá até
a Suíça e a seguir para a Dinamarca, onde se radicou por alguns anos.
O exílio
o levaria ainda à Finlândia e aos Estados Unidos. O autor de A Ópera dos
três vinténs e de outras obras inesquecíveis conseguiu escapar de Berlim
antes de começar a primeira onda de prisões do novo regime, que afundaria a
Alemanha e o mundo numa guerra sem precedentes.
Publicado em: https://agenorbevilacquasobrinho.blogspot.com/2013/11/a-lenda-do-soldado-morto-bertolt-brecht.html
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Autor: Agenor Bevilacqua Sobrinho
(Estudo introdutório: Maria Sílvia Betti)
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Páginas: 104
e-mail: editora@ciafagulha.com.br
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